31 março, 2011

Causas da decadência dos povos peninsulares

Tais temos sido nos últimos 3 séculos: sem vida , sem liberdade,sem riqueza,sem ciência,sem invenção,sem costumes.Erguemo-nos hoje a custo, Espanhóis e Portugueses, desse túmulo onde os nossos grandes erros nos tiveram sepultados . Erguemo-nos mas os restos da mortalha ainda nos embaraçam os passos ,e pela palidez dos nossos rostos podem bem ver o mundo de que regiões lúgubres e mortais chegámos ressuscitados!
Quais as causas dessa decadência , tão visível, tão universal e geralmente tão pouco explicada?(...)
Ora esses fenómenos capitais são três, e de três espécies: um moral, outro político, outro económico.
O primeiro é a transformação do catolicismo, pelo Concílio de Trento.
O segundo,o estabelecimento do absolutismo, pela ruína das liberdades locais.
O terceiro, o desenvolvimento das conquistas longínquas(descobrimentos).
Estes fenómenos assim agrupados, compreendendo os três grandes aspectos da vida social, o pensamento, a política e o trabalho, indicam-nos claramente  que uma profunda e universal revolução se operou, durante o século XVI, nas sociedades peninsulares  .
Se fosse necessária uma contraprova, bastava considerarmos o facto contemporâneo muito simples: esses três fenómenos eram exactamente o oposto dos três factos capitais,que se davam nas nações que cresciam,se moralizavam,se faziam inteligentes,ricas e poderosas,e tomavam a dianteira da civilização.
Aqueles três factos civilizadores foram a liberdade moral,conquistada pela Reforma ou pela filosofia; a elevação da classe média , instrumento do progresso nas sociedades modernas e directora dos reis até ao dia em que os destronou; a indústria, finalmente,verdadeiro fundamento do mundo actual,que veio dar às nações uma concepção nova do direito,substituindo o trabalho à força, e o comércio à guerra de conquista.
Ora a liberdade moral, apelando para o exame de consciência individual,é rigorosamente o oposto do catolicismo do Concílio de Trento, para  quem a razão humana e o pensamento livre são um crime contra Deus.; a classe média, impondo aos reis os seus interesses , e muita vezes o seu espírito, é o oposto do absolutismo,esteado na aristocracia e só em proveito dela governado; a indústria, finalmente, é o oposto do espírito de conquista, antipático ao trabalho e ao comércio.  
Assim,enquanto as outras nações subiam , nós baixávamos .Subiam elas pelas virtudes modernas; nós 
descíamos pelos vícios antigos,concentrados,levados ao sumo grau de desenvolvimento e aplicação.
Baixávamos pela indústria, pela política. Baixávamos sobretudo,pela religião.(...) 
As causas ,que indiquei, cessaram em grande parte: mas os efeitos morais persistem, e é a eles que devemos atribuir a incerteza, o desânimo o mal estar da nossa sociedade contemporânea(...)
Gememos sob o peso dos erros históricos.A nossa fatalidade é a nossa história.
Que é pois necessário para readquirirmos o nosso lugar na civilização ? Para entrarmos outra vez na comunhão da Europa culta? É necessário um esforço viril,um esforço supremo: quebrar resolutamente com o passado. Respeitemos a memória dos nossos avós(...)

(Antero de Quental, Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos três Séculos)

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